Uma equipe de investigadores da Lava Jato vai fazer uma devassa nas
contas da Paróquia de São Pedro, em Brasília, para descobrir como
o padre Moacir Anastácio Carvalho gastou cada centavo de quase um
milhão de reais recebidos das empreiteiras OAS, Andrade Gutierrez e Via
Engenharia, em 2014. O Ministério Público suspeita que o ex-senador Gim Argello
(PDT-DF), preso e denunciado na Lava Jato, e o ex-governador do Distrito
Federal Agnelo Queiroz (PT) tenham transformado a Casa de Deus em lavandeira com
o consentimento do padre para legalizar dinheiro de
propina. Em
depoimento prestado na quinta-feira em Curitiba, ao qual VEJA teve acesso, o
religioso admitiu que costuma pedir dinheiro a empresários e a fiéis que
frequentam a paróquia que administra. Como justificativa, Moacir alegou que a
igreja possui uma área de 20,6 hectares e que está construindo com muito
sacrifício um templo de 12,2 mil metros quadrados para acomodar uma das maiores
festas religiosas do país, Pentecostes, que começa neste domingo e reúne mais
de 3 milhões de pessoas em três dias de celebração. O evento a que o padre se
refere é famoso em Brasília por mesclar uma espécie de altar com palanque, no
qual políticos costumam pegar o microfone da mão do padre para pedir votos em
época de eleição ou exaltar os próprios feitos quando estão exercendo mandato
ou cargos no Executivo.
Ao prestar depoimento ao delgado federal Luciano
Flores, padre Moacir apresentou três recibos e um extrato bancário. Pelos
documentos, o religioso recebeu três repasses de empreiteiras em 2014. O
primeiro, no dia 14 de abril, foi de 300 000 reais e veio da Via Engenharia.
Segundo ele, a caridade foi obra de Agnelo Queiroz, que é investigado na Lava
Jato justamente por carregar nas costas a suspeita de receber propina da
empreiteira na construção do bilionário Estádio Mané Garrincha. A segunda
doação ocorreu no dia 19 de maio no valor de 350 000 reais. Dessa vez o
dinheiro veio da OAS e foi costurado por Gim Argello, que frequenta a paróquia
do padre Moacir há mais de 10 anos. Duas semanas depois caiu na conta da igreja
outros 300 000 reais, fruto da boa vontade da Andrade Gutierrez, cujo
ex-presidente, Otávio Azevedo, está preso acusado de pagar propina na obra da
usina nuclear Angra 3.
Os investigadores trabalham com a hipótese de que o
dinheiro depositado na conta da igreja de Brasília é parte da propina que Gim
Argello recebeu para manter executivos de empreiteiras bem longe das comissões
de inquérito que investigavam corrupção na Petrobras no Senado e na Câmara, há
dois anos. Gim, Agnelo, o padre e as empreiteiras negam tudo, claro. "Os
políticos disseram que iam conseguir dinheiro para a festa junto a empresários,
mas não mencionaram quais empresas", disse o padre em depoimento. "Só
tomei conhecimento que parte do dinheiro veio da OAS quando fui intimado",
completou.
Apesar de o religioso não constar na lista dos
denunciados na de sexta-feira, a Polícia Federal vai continuar em seu encalço.
Os investigadores vão analisar toda a contabilidade da paróquia para atestar se
a instituição foi usada para lavar dinheiro de corrupção. Em depoimento, o
padre jurou que não devolveu um tostão para Gim Argello e Agnelo Queiroz.
"Usei 800 000 reais na festa e o restante em obras de terraplenagem do
estacionamento do centro de evangelização", sustenta.
O advogado do padre, Wellington Medeiros, disse que
o seu cliente não teme a devassa da PF nas contas da paróquia e que até já se
adiantou, deixando com os investigadores da Lava-Jato uma mala contendo todos
os documentos contábeis da igreja, incluindo notas, extratos, cópia de cheques
e balanços. "Nem sempre as pessoas entendem que é muito caro construir um
templo de 12,2 mil metros quadrados em uma cidade em que cada metro quadrado
construído custa 2,2 mil reais", defende-se.
Apesar de ser obrigatório os sacerdotes selarem
voto de pobreza no momento da ordenação, o padre Moacir montou já usando batina
uma empresa chamada MAC - Livros e Artigos Religiosos para comercializar
publicações de sua autoria. O religioso também é proprietário de um apartamento
comprado em Fortaleza, em 2008, e mais dois imóveis na cidade de Águas Claras,
no Distrito Federal, comprados depois que passou a se dedicar à igreja. Depois
que o padre levou a sua paróquia para as páginas da Lava Jato, a Confederação
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) determinou que ele não passe mais o
microfone para políticos em seus shows religiosos. Até segunda ordem.
Fonte: MSN
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