Ao
longo das últimas décadas, a classificação dos sintomas e o próprio diagnóstico
da depressão registraram avanços significativos – a doença deixou de ser
considerada banal, uma espécie de momento de fraqueza ou mesmo frescura, e
chegou a ser referendada por diversas entidades médicas de cunho internacional
como o mal do século. No Dia Mundial da Saúde, lembrado hoje (7), o transtorno
foi escolhido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como tema prioritário e
de suma importância.
Para
o diretor executivo e professor do Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica,
Ciências Humanas e Sociais, João Nolasco, falar sobe depressão, conforme
recomenda fortemente a própria OMS, deve ser o primeiro e mais importante passo
não apenas para que fique claro que há tratamento para a doença – figura também
como uma estratégia essencial para garantir o diagnóstico precoce, evitar o
agravamento do quadro e, consequentemente, reduzir o número de casos crônicos
do transtorno.
“A
distimia ou depressão leve é uma doença silenciosa. Hoje, entretanto, 6% da
população mundial são acometidos por esse quadro. O indivíduo sofre calado e é
comumente caracterizado como uma pessoa rabugenta ou mal-humorada. Atualmente,
sabe-se que não se trata só de uma característica de humor ou temperamento. A
pessoa está sempre triste, tudo é ruim, nada está bom. É alguém que não sente
prazer ao realizar suas atividades rotineiras, mas consegue conviver, não se
prostra”, explicou.
Confira,
na íntegra, a entrevista com o psicanalista sobre a importância do diagnóstico
precoce como estratégia para combater quadros crônicos de depressão:
Agência
Brasil - É possível falar em prevenir casos crônicos de depressão?
João
Nolasco - Dentro de um conceito psicanalítico, a grande prevenção da depressão
gira em torno de a pessoa compreender a si mesma, já que a doença mexe com o
que chamamos de falta de gerenciamento das emoções. Quando a gente não consegue
ter essa percepção ou essa capacidade de gerenciar as emoções em torno do que
acontece ao nosso redor, vão surgir diversos sentimentos e mecanismos de
defesa. E um desses mecanismos pode se transformar em uma neurose ou em uma
depressão. É uma espécie de baixa polaridade. Esse indivíduo se recolhe e, de
alguma forma, quer fugir daquela dor.
Agência
Brasil - O que fazer diante de um quadro de tristeza persistente?
Nolasco
- Nesses casos, a reação deve ser sempre a busca pela psicoterapia. Em alguns
casos, claro, se fazem necessários a entrada de medicamentos e o atendimento
psiquiátrico. Mas a psicoterapia não pode faltar nunca, para que o indivíduo
comece a compreender os porquês de tudo isso que acontece com ele. Trata-se de
uma oportunidade para que consiga mudar. É como Sigmund Freud costumava dizer:
quando a dor de não estar vivendo for maior do que o medo da mudança, a pessoa
muda. Partimos desse princípio: a gente tem que fazer essa caminhada dentro de
nós mesmos. Afinal, viver triste, prostrado e mal-humorado não é legal para
ninguém.
Agência
Brasil - No que exatamente consiste o tratamento?
Nolasco
- As perguntas que sempre faço aos meus pacientes são: onde você estava? Onde
está agora? E onde quer chegar? Também é preciso questionar-se: Quem você era?
Quem você é agora? E quem você quer ser? Isso abre portas para novas
descobertas e se revela como uma oportunidade de rever a vida. A depressão leve
pode aparecer como uma espécie de primeira fase para um processo de depressão
severa ou crônica. Isso porque o quadro pode se agravar e se tornar muito mais
intenso. Tanto é que levamos em torno de dois anos, desde o aparecimento dos
primeiros sintomas, para chegar ao diagnóstico de distimia.
Agência
Brasil - Ainda há muita confusão em torno do que é a depressão e de quais são
seus sinais e sintomas?
Nolasco
- As pessoas ainda confundem muito a tristeza com a depressão. Apesar da
aparente contradição, é importante saber que o indivíduo, para ser feliz,
precisa ter tristeza. Só que essa tristeza tem dia, hora e local para surgir. E
sair dela deve ser um processo natural, assim como entrar nela foi um processo
natural. O processo depressivo, na verdade, só se agrava devido à proporção com
a qual se vive essa tristeza. Quanto mais tempo o paciente leva para procurar
ajuda, mais comprometido física e emocionalmente ele vai ficar. Às vezes, ele
próprio não tem essa percepção. Vai indo, vai indo e, quando vê, já está
totalmente tomado pelo problema.
Fonte: Agência Brasil
Foto: burakoli.com
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